Quem imagina que o bairro Jardim Califórnia, na Zona Oeste de Bebedouro, vive da fama de ser apenas o vizinho ou depende do Jardim Alvorada se engana. Ali, os moradores sabem valorizar uns aos outros e têm na boa convivência, na harmonia e na tranquilidade, o lado bom e positivo de morar na região. Quem passa pelas ruas do bairro percebe um comércio ativo, com salão de cabeleireiro, costureiras e manicures. Por outro lado, o setor industrial também é forte ao longo da principal via de acesso ao bairro, a Avenida Francisco Martins Alvarez.
Porém ao conversar com os moradores do bairro, nota-se que a satisfação restringe apenas às questões pessoais entre os habitantes do Jardim Califórnia. Uma visão não muito apurada nem detalhada revela que, para uma qualidade de vida digna em uma área urbana, havia há muito que ser feito e a atual situação do bairro, não somente pelas palavras e definição dos próprios moradores, mostra um estado de abandono e esquecimento por parte da administração pública.
Entre alguns moradores entrevistados aleatoriamente no bairro, a moradora Maria Rosa Pereira da Silva, que há 25 anos vive na Rua João Batista Catalani, a antiga Alameda 13, é quem mais define o sentimento de indignação da maioria das pessoas que vive no Jardim Califórnia. “É um bairro que está muito abandonado. Aqui tem água empoçada, a rua não tem condições de andar. Está abandonado mesmo”, revela a moradora. No setor da Saúde, os habitantes do bairro são usuários da UBS do Jardim Sanderson e do programa Estratégia de Saúde da Família (ESF) do bairro Alvorada.
Maria Rosa alerta que, desde a inauguração, a setor de Saúde do bairro não teve melhorias, fazendo com que a realidade atual não atenda às expectativas dos moradores. “Não teve nenhuma melhoria, principalmente no Posto de Saúde do bairro Alvorada, onde minha mãe recebe atendimento. Lá não tem nem papel para fazer as receitas”, reclama. Para ela, o atendimento dos funcionários também não é satisfatório. “A situação está precária e o atendimento é ruim. Várias vezes ficamos sem atendimento, porque só tem um médico para atender a pediatria, clínico geral, ginecologia, etc.”
Lazer
O Jardim Califórnia é um bairro residencial que tem muitas crianças em todas as ruas. É comum encontrar garotos soltando pipas nas calçadas, mas a falta de estrutura melhor de lazer para a população faz com que, mesmo que inadequadamente, as ruas sejam o local de diversão. Alunos que saem da EMEB Professor Octávio Guimarães de Toledo têm que caminhar pela rua, pois a falta de uma praça com passeio público na Rua Mário Sgarbi, os impossibilita de passar por locais seguros.
Quem revela outro problema é Ângela Maria Maciel, moradora da Rua 9. Ela diz que gosta do bairro e é um setor muito tranquilo, mas se incomoda com a falta opções de lazer para as crianças e não as deixa ir para o bairro vizinho. “Falta uma praça. Aqui não tem nada. Não podemos nem deixar as crianças irem lá para cima (Jardim Alvorada) por causa das pessoas que consomem droga na praça. É muito perigoso”, revela.
Um bairro sujo e com medo da dengue
A cidade de Bebedouro já foi muito reconhecida pela limpeza das ruas e elogiada por qualquer visitante que passasse pela cidade. Mas o mesmo, atualmente, não pode ser dito, nem vangloriado pelos moradores de algumas ruas que chegam a ficar até uma semana sem recolhimento de lixo doméstico. Alguns deles são vencidos pelo cansaço e chegam a levar os sacos plásticos até um local mais urbanizado para não ter a saúde de toda família comprometida com o acúmulo de sujeira e proliferação de moscas na porta de casa.
Moradores da Rua Mário Sgarbi reclamam da falta de limpeza no bairro. Um dos entrevistados que preferiu não ter o nome revelado, mora perto de um imenso terreno baldio ao lado da Escola Municipal Professor Octávio Guimarães de Toledo, que se estende até o Parque Eldorado. Próximo ao Jardim Califórnia há duas mangueiras muito altas e antigas, mas que, sem os cuidados de poda das árvores, tornam-se alvo de críticas dos moradores devido à escuridão à noite e consumo de entorpecente na região.
Há 15 anos morando no bairro, dona Esmeralda Correia diz que os animais que pastam no terreno baldio e o lixo acumulado também são problemas. “Tem uns cavalos que são colocados aqui e nesse terreno é jogado tudo quanto é nojeira: de lixo a cachorro morto. Tem dia que a gente não aguenta”. Ela alerta que se o terreno fosse limpo, as pessoas respeitariam. Com bronquite, ela diz que sofre com a sujeira do bairro e a poeira vinda do terreno. “Sofro com essa poeira por causa da bronquite. As roupas do varal sujam. Minha sobrinha cansou de pedir melhorias para a Prefeitura, mas ninguém dá atenção”.
Quem também mora de frente ao terreno é Silveli de Freitas. Ela comenta que as pessoas aproveitam o terreno público abandonado para jogar lixo. Por outro lado, ela denuncia que a coleta de lixo não é realizada regularmente na Rua Francisco de Souza Braga. “Meu lixo está aqui faz uma semana”, afirma. A saída é resolver o problema com as próprias mãos: “eu tenho que pegar e jogar em outro lugar, em algum cesto na avenida”, destaca a moradora.
Quem confirma a situação da falta de limpeza é Maria Rosa, moradora da Alameda 13. Para se ter uma dimensão da reclamação dela, ela mora perto da rua que faz ligação com o Parque Eldorado e passa em frente à Escola do Sesi. “Não tem limpeza no bairro, os entulhos ficam mais de 30 dias nas ruas, os lixeiros não passam todos os dias, no máximo duas vezes por semana. O lixo fica atraindo moscas, mosquitos, varejeiras e os lixeiros não recolhem”, revela.
Maria Rosa faz um alerta quanto ao problema da dengue. “Essa rua tem água empoçada. Eles (Vigilância Epidemiológica) falam em dengue, mas procuram dengue só na casa da gente (…). Mas aqui, a dengue pode estar do lado de fora e não dentro de casa”, relata indignada a moradora que, junto com o filho, já foram picados pelo mosquito Aedes aegypti: “já sofremos com isso”.
Moradores pagam impostos, mas nunca viram asfalto
O drama que vivem as famílias de Silveli de Freitas e de Joelino Batista da Costa é o retrato da situação de muitos que moram em duas ruas do Jardim Califórnia: a falta de infraestrutura viária para entrar e sair de casa. Silveli se mudou há três meses para a Rua Francisco de Souza Braga, mas antes de se mudar, ainda em fase de construção do imóvel, já vinha solicitando melhorias na rua, que sempre foi de terra, apesar de estar no centro do bairro.
Hoje, o drama de morar em uma rua de terra se reflete dentro de casa. “Meu dia-a-dia é complicado porque eu trabalho, não tenho condições de pagar alguém para limpar minha casa”, comenta. Ela aponta os principais problemas sofridos: “quando passa carro, espirra pedra no portão. Quando chove é lama, meu marido entra com o carro no quintal e suja tudo. Os parentes nem querem nos visitar devido a esse problema (…)”, relata a moradora que precisa sair diariamente de moto para trabalhar e trafega pela calçada do vizinho, devido a buraco em frente à casa dela, calçado com pedaços de madeira. “Se sair pela rua, a moto atola e é perigo até eu cair no barro”, revela.
Quem passa por esta rua diariamente é Aline Patrícia Brito Teixeira. Ela trabalha no Jardim do Bosque e a rua de terra é o caminho mais curto para a casa dela. Aline informa: “faz tempo que está assim. Faz cinco anos que passo por aqui e sempre foi assim”, diz a pedestre, que precisa mudar o itinerário quando chove. “Em dias de chuva não tem nem condições de passar por aqui. Se passar por aqui a gente chega suja em casa, calçado sujo. Sem falar que quando passa um carro ou caminhão, levanta poeira. Eu tenho problema respiratório, então fica difícil”, explica.
Já para o senhor Joelino Batista da Costa, o problema existe há mais tempo. Morador há 12 anos na Rua Aníbal de Carvalho, a última do bairro, ele foi visto pela reportagem sentado em um banquinho, em frente à casa dele, folheando um bloquinho. Ao ser questionado sobre o problema da rua, ele mostra o carnê e responde: “o problema está na minha mão: o talão do IPTU. Por coincidência você veio aqui no momento certo”, comenta. Ele diz que a rua nunca teve asfalto e nunca alguém passou por lá para saber que problema existe. “Não existe previsão para sairmos desta situação”, aponta.
Para ele, o problema vai além da seca e da chuva. “A gente quer fazer melhoria na casa, mas não tem como. Não dá para fazer calçada porque não sabemos a divisão com a rua. Não tem um ponto de referência da guia”, explica o morador. Ele trabalha com distribuição de gás e diz que passa pelo menos duas vezes por dia nas ruas do Jardim Califórnia e reclama que o asfaltamento precário das outras ruas causa danos constantes à suspensão do carro dele. “A única coisa que espero nesta rua é o asfalto e melhorias nas outras. No restante o bairro é bom e a tranquilidade é total”, finaliza.
Fonte: O Jornal Bebedouro